Apesar de todo o sangue derramado e dos apelos da comunidade internacional por um cessar-fogo e uma pausa no sofrimento da população de Gaza, o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, insiste que a operação ainda durará “muitos meses mais”.
Em Israel, onde o serviço militar é obrigatório e tem grande protagonismo na vida dos cidadãos, os assassinatos e sequestros realizados pelo Hamas provocaram uma onda de patriotismo e de apoio às Forças de Defesa de Israel (FDI), como o exército é conhecido.
Nesse contexto, o jovem de 18 anos Tal Mitnick decidiu ir contra a corrente e tornou-se o primeiro israelense preso por se recusar a participar da guerra.
Quando foi convocado pelo Exército, dirigiu-se ao centro de recrutamento e comunicou sua recusa.
“Tomei a decisão quando percebi que minha consciência não me permitia participar das ações e ideias contra os palestinos”, disse à jornalista da BBC Rebecca Kesby.
“Eu não podia participar da ocupação ou de uma organização que acredita que a violência é a maneira de resolver os problemas”.
Ele foi condenado a passar 30 dias em uma prisão militar, na qual teve que viver como um soldado, exatamente o que não pretende ser.
Ficou confinado, sujeito a uma disciplina militar e teve de passar longos momentos em posição de sentido.
Mas o castigo não o fez mudar de ideia.
Na próxima semana, ele deve se apresentar novamente e diz que se recusará mais uma vez a lutar por considerar a guerra absurda e acreditar que só causa dor desnecessária. Ele argumenta que a história do conflito entre israelenses e palestinos prova isso.
“Toda a violência que vimos nos últimos 70 anos não resolveu nada. Precisamos mudar e a única mudança que vemos é em direção a mais violência. Mais violência e mais sangue não vão consertar nada”.
Os ataques do Hamas fizeram muitos israelenses sentirem que seu país vive sob uma “ameaça existencial”.
A interpretação é de que seguem muito presentes a tentativa de exterminar o povo judeu, representada pelo Holocausto, e as sucessivas guerras entre Israel e seus vizinhos ao longo da história, onde ainda há grupos como o Hamas ou o Irã, que não reconhecem direito de o país existir.
Mitnick esclarece que, apesar de sua postura crítica em relação à guerra, ele rejeita totalmente a violência do Hamas.
“Os ataques foram horríveis e totalmente injustificados. Todos em Israel perderam alguém mais ou menos próximo, mas não podemos permitir que essa dor resulte em um sentimento de vingança. Não podemos permitir que o exército faça o que o Hamas fez com a gente, não podemos deixar mais famílias em dor”, defende.
Entre seus compatriotas, há quem não entenda sua decisão.
“Tem sido difícil porque fui apresentado como um traidor, mas as minhas opiniões são legítimas”, diz ele.
‘Qual é o sentido disso?’
Para ele, a guerra de Gaza não é apenas um trágico uso de violência que já custou milhares de vidas, incluindo as de mais de 500 soldados israelenses, mas também é contraproducente para Israel.
“Quando começarmos a buscar a paz, quando o país realmente começar a ver os palestinos como seres humanos, será quando conseguiremos ter segurança”.
A poucos dias de ter que se apresentar novamente, ele se mostra determinado a não dar o braço para torcer. Ele também não pretende recorrer a manobras administrativas que poderiam livrá-lo de uma mais do que provável segunda condenação, como alegar problemas mentais, porque se recusa a acreditar que suas convicções possam ser consideradas um problema mental.
“Com o tempo, as pessoas verão que a minha decisão é a certa e eu não vou mudá-la. Ninguém deve colocar sua vida em risco,” acredita.
“O governo enviar todas essas pessoas para morrer por nada não vai nos trazer nenhuma segurança, e estamos vendo isso com mais soldados e civis morrendo todos os dias. O Hamas não está enfraquecendo. Qual é o sentido desta guerra para além de vingança?”.