- Author, Samuel J. White e Philippe B. Wilson
- Role, The Conversation*
Passamos cerca de 90% das nossas vidas em ambientes fechados. Mas o que talvez você não perceba quando está no aconchego do lar é que você não divide seu espaço apenas com sua família ou animais de estimação — você também compartilha sua casa com milhões de micróbios invisíveis.
Na verdade, a poeira doméstica abriga 9 mil espécies diferentes.
Assim como nosso intestino e boca, nossas casas também possuem um microbioma.
Conhecido como “microbioma doméstico”, trata-se do intrincado ecossistema de bactérias, fungos, vírus e outros micro-organismos que prosperam nos lugares em que vivemos, trabalhamos e estudamos.
À medida que os pesquisadores se aprofundam no estudo do microbioma doméstico, seu impacto significativo na nossa saúde está se tornando cada vez mais evidente.
Pesquisas atuais mostram que ele pode ter influência em tudo — na nossa saúde respiratória, em como nosso sistema imunológico funciona e até mesmo em nosso bem-estar mental.
Comunidade microbiana
O microbioma doméstico é significativamente influenciado por nós. Cozinhar, fazer faxina e até mesmo ter um animal de estimação interferem nas populações microbianas da nossa casa.
Curiosamente, o design e a operação dos edifícios também desempenham papéis cruciais na determinação de que micróbios prosperam em ambientes fechados.
Por exemplo, o tipo de sistema de ventilação em vigor, a presença de luz natural e os materiais de construção usados podem promover ou inibir o crescimento de certos micróbios.
O microbioma doméstico pode influenciar nossa saúde de maneiras positivas e negativas.
Pelo lado positivo, a exposição a uma grande variedade de micróbios pode estimular nosso sistema imunológico, especialmente durante a infância.
Essa ideia é baseada na hipótese da higiene, que sugere que a exposição precoce a micróbios ajuda a treinar o sistema imunológico a distinguir entre agentes nocivos e inofensivos.
Isso pode reduzir a probabilidade de desenvolver certas alergias e doenças autoimunes (como asma, alergia ao pólen (hay fever), eczema e esclerose múltipla).
Essa exposição microbiana também pode reforçar o sistema imunológico contra doenças respiratórias comuns, como resfriado, gripe e bronquite.
Mas a exposição a certos micróbios também pode ter consequências negativas.
Certos ambientes fechados — particularmente aqueles com má ventilação e altos níveis de umidade — podem abrigar patógenos nocivos. Condições de umidade e mofo, por exemplo, estão associadas a problemas respiratórios, como asma e alergias.
A má ventilação também pode permitir que doenças respiratórias comuns, como a covid-19, se espalhem com mais facilidade.
Além disso, o uso de produtos de limpeza antimicrobianos em ambientes fechados pode inadvertidamente facilitar o desenvolvimento de bactérias resistentes a antibióticos — representando um risco significativo à saúde pública.
Quando as bactérias são frequentemente expostas a produtos de limpeza antimicrobianos, elas desenvolvem mecanismos habilidosos que as ajudam a sobreviver e prosperar, mesmo quando estes produtos forem usados no futuro.
Além da saúde física, novas evidências sugerem que o microbioma doméstico também pode influenciar a saúde mental.
A vida urbana tem sido associada a um risco maior de problemas de saúde mental — como depressão. Embora provavelmente haja muitos fatores em jogo, isso pode estar relacionado ao eixo intestino-cérebro.
Este é o canal que o microbioma intestinal usa para se comunicar com o cérebro — o que também influencia o humor e a função cognitiva.
Pessoas que moram em cidades são expostas a menos espécies microbianas do que aquelas que vivem em zonas rurais. Isso pode fazer com que tenham um microbioma intestinal menos diverso, o que pode interferir na comunicação entre o intestino e o cérebro, contribuindo para transtornos de saúde mental.
Como criar espaços mais saudáveis
Dada a influência do microbioma doméstico na nossa saúde, há um interesse cada vez maior em moldar intencionalmente essas comunidades microbianas para promover bem-estar.
Por exemplo, os edifícios podem ser projetados de forma a colaborar naturalmente para um microbioma saudável. Isso pode ser feito com o uso de materiais naturais — como a madeira, que pode abrigar micróbios benéficos — ou projetando sistemas de ventilação que aumentem a diversidade microbiana.
Outras maneiras de projetar “edifícios saudáveis” para otimizar o microbioma doméstico podem incluir “paredes vivas”, com plantas e vida microbiana variadas, ou usar materiais de construção incorporados com esporos bacterianos benéficos, que podem ser ativados quando necessário.
Estas inovações podem ajudar a minimizar o número de micróbios nocivos e, ao mesmo tempo, nos expor aos benéficos.
Outra estratégia promissora é o uso de probióticos — não apenas para nossos corpos, mas para nossos edifícios. Produtos de limpeza probióticos, que introduzem micróbios benéficos no ambiente, estão sendo estudados como uma forma de eliminar patógenos nocivos e promover um microbioma doméstico mais saudável.
As plantas para áreas internas também podem contribuir para um ambiente microbiano mais saudável. As plantas não só purificam o ar, como também cultivam comunidades microbianas diversificadas em ambientes fechados.
O microbioma doméstico é um aspecto crucial, embora muitas vezes negligenciado, da nossa vida. À medida que nossa compreensão do microbioma doméstico se aprofunda, o potencial para projetar espaços que melhorem nossa saúde se torna cada vez mais viável.
Este conhecimento pode levar a um futuro em que casas e locais de trabalho não sejam apenas um abrigo, mas contribuam ativamente para o nosso bem-estar.
O desafio agora está em tornar estes avanços acessíveis a todos — garantindo que todo mundo possa ter um microbioma doméstico saudável, independentemente de sua condição socioeconômica.
* Samuel J. White é professor e chefe de projetos na Universidade York St. John, no Reino Unido.
Philippe B. Wilson é vice-reitor de inovação e intercâmbio de conhecimento na mesma universidade.
Este artigo foi publicado originalmente no site de notícias acadêmicas The Conversation e republicado aqui sob uma licença Creative Commons. Leia aqui a versão original (em inglês).